O OUTRO LADO DA MOEDA!!!

11.21.2005

Destino dos Balcãs é definitivamente a U.E.

In PÚBLICO, 21.11.2005, Teresa de Sousa

Os Acordos de Dayton, concluídos há dez anos, puseram fim ao mais sangrento conflito europeu depois da II Guerra. Bruxelas acaba de anunciar o início das negociações com vista a um acordo de "associação e estabilização" com Sarajevo - a fórmula oferecida pela UE a todos os países dos Balcãs Ocidentais e o primeiro passo para a futura integração.

Arrancados a ferros pela Administração Clinton aos líderes da Sérvia, Slobodan Milosevic, da Croácia, Franjo Tudjman, e da Bósnia, Alija Izetbegovic, na base Wright-Patterson, em Dayton, Ohio, depois de três semana de negociações ininterruptas, os acordos punham termo a uma guerra fratricida que custou a vida a mais de 200 mil pessoas e transformou 2 milhões em refugiados, na sua maioria muçulmanos bósnios.
Graças à intervenção americana, os líderes europeus viam finalmente chegar ao fim a tragédia de um conflito europeu que não foram capazes de impedir e, muito menos, de resolver.Hoje, os Estados que emergiram da desagregação violenta da Jugoslávia comunista ainda não sararam as feridas abertas pela guerra mas estão, todos, no bom caminho para a futura integração na União.
A feliz Eslovénia, a única república da ex-Jugoslávia que conseguiu escapar ao conflito, é membro da UE desde 1 de Maio do ano passado.
A Croácia iniciou a 3 de Outubro as negociações de adesão. A pequena República da Macedónia acaba de receber parecer favorável da Comissão ao seu pedido formal de candidatura. A República da Sérvia-Montenegro iniciou há um mês as negociações de um "acordo de associação e estabilização" com Bruxelas.
Mas ainda vai ser preciso a Belgrado resolver a questão do estatuto final do Montenegro e do Kosovo para merecer da UE a consideração de uma futura entrada. Em 2006, a população do Montenegro decidirá em referendo o seu destino - autonomia reforçada ou independência.Sob os auspícios da ONU, teve início também este mês o processo negocial que deve conduzir ao estatuto definitivo do Kosovo - a quase inevitável independência. Em 1999, os EUA e a Europa voltaram a ter de intervir militarmente contra a Sérvia, ainda governada por Slobodan Milosevic (hoje a ser julgado por crimes de guerra e conta a humanidade no Tribunal Penal Internacional da Haia), para pôr cobro a uma nova vaga de "limpeza étnica" contra a população muçulmana que representava 90 por cento da população da província do Kosovo.
Para que as contas com o passado fiquem definitivamente saldadas, apenas falta capturar e entregar ao Tribunal da Haia dois dos principais responsáveis pelas atrocidades cometidas na Bósnia conta a população muçulmana - o antigo líder sérvio bósnio Radovan Karadjic e o seu comandante militar, general Ratko Mladic, responsável directo pelo massacre de Srebernica. Sem isso, disse o Alto Representante da comunidade internacional, actualmente o britânico Paddy Paddy Ashdown, "não será feita justiça e os Balcãs não poderão entregar-se totalmente a esta nova fase europeia da sua história."
Rever Dayton
Uma das condições para a negociação de um acordo europeu de "associação e estabilização" com a Bósnia é, precisamente, a revisão dos acordos de paz celebrados há dez anos. Em Outubro passado, o comissário europeu responsável pelo alargamento, Olli Rehen, colocou a questão da seguinte forma: "A Bósnia tem agora de passar da fase de construção da paz para a da construção do Estado".
Dayton estabeleceu uma Constituição para a Bósnia ainda fortemente ditada pela guerra, que consagrou duas entidades políticas separadas fortes - a Republica Srpska, maioritariamente sérvia, e a Federação Croata-Muçulmana, unidas por Estado central fraco. Esta continua a ser a realidade política, apesar de alterações constitucionais que permitiram, por exemplo, a unificação sob o mesmo comando do exército e da polícia das duas entidades.
A autoridade central foi, na prática, exercida por Ashdown, dotado de amplos poderes legais. Trata-se agora, como ele próprio disse perante o Conselho de Segurança da ONU no passado mês de Outubro, "de encarar o pós-Dayton e encontrar um novo modelo [constitucional] de forma a avançar no quadro do processo europeu de associação e estabilização." Ou seja, de transferir rapidamente os poderes da comunidade internacional para um Estado central forte e unitário.
Vigorosamente impulsionado por Washington, esse processo de revisão começou no início deste ano. Conta com a abertura de muçulmanos e croatas mas com a oposição dos sérvios da República Srpska. Washington acredita na possibilidade de um acordo final quando, amanhã, os líderes bósnios se encontrarem com a secretária de Estado Condoleezza Rice na capital americana para celebrar o décimo aniversário do fim do conflito. Embora numa posição menos interventiva, a UE tem participado activamente no processo.
A revisão constitucional visa substituir a presidência tripartida da Bósnia (um muçulmano, um croata e um sérvio) por um só Presidente da República e dois vice-presidentes universalmente eleitos e criar espaço para a formação de um governo central em condições de gerir o país.
Com os seus 3,8 milhões de habitantes – 40 por cento bósnios muçulmanos, 31 por cento sérvios ortodoxos e 10 por centro croatas católicos, a Bósnia-Herzegovina continua a ser um país etnicamente dividido, assente numa economia fraca que tem vivido de ajudas internacionais. Até recentemente, a paz conquistada em Dayton foi garantida pela presença dissuasora de um forte contigente militar da NATO.
Hoje, é a União Europeia que garante a estabilidade, mantendo apenas 6000 homens no terreno. O objectivo é agora substituir a presença militar pela progressiva integração no grande espaço europeu sem fronteiras.